terça-feira, 18 de setembro de 2012

O tênis velho chega na frente


Pense duas vezes antes de se desfazer daquele par surrado que rodou até dizer chega. Testes feitos em tênis de corrida por professores de educação física da Universidade de São Paulo revelam que, amaciado pelo tempo de uso, esse tipo de calçado distribui melhor a pressão na planta do pé.

 Zero quilômetro, para valer a pena, só se for carro. Para correr, bom mesmo é calçar um tênis rodado. Quem garante é o fisiologista Júlio Cerca Serrão, que entende do assunto como ninguém. Afinal, tem uma tese de doutorado sobre calçados esportivos e continua pesquisando o tema no Laboratório de Biomecânica da Universidade de São Paulo (USP). "Fizemos testes de zero a mil quilômetros e os tênis continuavam funcionando perfeitamente", revela. Isto é, a proteção contra o impacto continuava intacta, mesmo depois dos 600 quilômetros, marca em que os corredores costumam aposentar os calçados. "Ao final, só houve um problema: eles estavam meio sujos e feios", brinca o especialista.

A investigação até virou tese de mestrado de outro expert, o professor de educação física Roberto Bianco, que colheu dados nos testes de zero a 300 quilômetros de três modelos de tênis de corrida, dois específicos para competição e um para treinamento, conforme a orientação do fabricante. "Como o tênis de competição é mais leve e tem menos material, achamos que poderia durar menos, mas não houve diferença significativa entre os modelos", afirma Bianco. Em resumo: depois de uma maratona, você não precisa jogar o tênis fora — especialmente, diga-se, se ele for de qualidade.

A pesquisa ainda mostrou que a área de contato entre a planta do pé e a palmilha do calçado aumentou 12% do zero aos 100 quilômetros. "Com o tempo de uso, o tênis vai se desgastando e se acomodando ao pé", explica Serrão. "O ajuste melhora a resposta biomecânica, diminui a pressão e aumenta o desempenho do atleta", resume. 


Na planta do pé

Entenda de uma vez por todas a diferença entre impacto e pressão

O impacto é a força de reação do solo exercida sobre o calcanhar, o primeiro a se encostar no chão. Ele repercute nas pernas e nos quadris. O tênis, velho ou novo, se for de boa marca, confere proteção, mas não elimina o impacto por completo.

A pressão é a forma como o impacto é distribuído na planta do pé. Quanto maior a área, menor a pressão. Em média, a área de contato entre uma palmilha bem usada e o pé é 5,6 centímetros quadrados maior em relação às mais novas. Ou seja, o tênis velho reduz a pressão.
Com tênis ou descalço?
Veja como a pisada muda conforme a situação

1. Como o sistema de amortecimento é caprichado na parte posterior do tênis, o certo é apoiar primeiro com o calcanhar, encostar a lateral externa do pé no chão e, enfim, pisar com a ponta.
2. Num reflexo inconsciente para distribuir as forças e proteger o aparelho locomotor, o pé descalço encosta logo de cara toda a planta no chão. E depois apóia só na ponta para dar a próxima passada.


Sabe aquela idéia de que o tênis confere uma espécie de proteção mágica? "Não é bem assim", diz Júlio Serrão. O impacto depende não só do calçado mas também do tipo de piso e do padrão de movimento da pessoa — se ela flexiona ou não os joelhos na aterrissagem, por exemplo. Hoje em dia tem até muita gente treinando sem tênis numa boa. "O exercício deixa a musculatura do pé mais ativa e ajuda a formar o arco plantar", aprova Serrão. "Mas a pessoa tem que estar acostumada, senão fatalmente irá se machucar", previne o professor de educação física Marcos Paulo Reis, dono da MPR Assessoria Esportiva, em São Paulo. Com um olho na tendência e o outro no medo que as pessoas têm de pisar descalças por aí, a Nike desenvolveu o Nike Free, um tênis que reproduz a sensação de pé descalço.

Modismos à parte, preocupe-se em escolher um calçado de marca conhecida, para ter garantia de qualidade. O par também deve ser confortável. A recomendação parece óbvia, mas tem razão de ser. "Isso é sinal de que há pouca pressão plantar", justifica a professora de educação física Katia Brandina, também da USP. Ela pesquisou a percepção de dez corredores e descobriu que ninguém identificava as variações de impacto, mas todos percebiam as de pressão. E, de fato, a pressão alta é sentida na pele — que o digam as queimações e as bolhas.

Os corredores de carteirinha já sabem que o modelo deve respeitar o seu tipo de pisada: pronador, supinador ou normal. "Existem testes para identificar o seu padrão, mas, como a passada varia conforme a velocidade, o ideal é que o seu treinador o observe correndo", dá a dica Marcos Paulo Reis. E até mesmo os veteranos talvez não saibam que as meias podem fazer a maior diferença. "As melhores levam algodão e poliamida e têm o pé certo para cada lado."

Um último aviso: muitos corredores têm o hábito de deixar o tênis "descansar" para evitar o chamado bottom-up — a compactação do material do solado causada pelos saltos. Tanto zelo com o calçado é desnecessário, mas com o nosso corpo... "Todo mundo se preocupa com o tênis e se esquece de cuidar de si", lamenta Júlio Serrão. O tênis tira dia de folga, mas o corredor não. "Em geral as fraturas por estresse são causadas pelo excesso de treino, isto é, por sobrecarga mecânica repetitiva", avisa o ortopedista Arnaldo Hernadez, chefe do Grupo de Medicina Esportiva da Faculdade de Medicina da USP. O ideal é programar melhor os treinos, mesclando volume e intensidade e prevendo dias de descanso. Para você, não para o tênis.



Fonte: Revista saúde




Nenhum comentário:

Postar um comentário